Chegavam inúmeras demonstrações de afeto e de apoio da sociedade já nos primeiros dias de setembro de 2018, enquanto o corpo social se unia para manter ininterruptas suas atividades de pesquisa, ensino e extensão. Apesar de todos os desafios, foi realizado nos dias 22 e 23 de setembro daquele ano o Festival Museu Nacional Vive, recebendo o público na Quinta da Boa Vista por meio de um trabalho intenso, coletivo e simbólico.
Passados 5 anos desse momento, o Harpia resgata essa história importante da nossa reconstrução.
As motivações iniciais
O Museu Nacional/UFRJ já participava há anos da Primavera dos Museus, organizada nacionalmente pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM). Em 2018, as inscrições para a Primavera foram encerradas no início do mês de agosto, e o Museu tinha se inscrito com atividades culturais e educativas que ocorreriam nas próprias exposições do Museu, no palácio e on-line. A Seção de Museologia (SEMU) era responsável por organizar a inscrição das atividades dos diferentes setores do Museu, junto ao IBRAM.
A museóloga Thaís Mayumi relata que há apenas uma semana depois do incêndio, eles começaram a conversar e, junto com o Núcleo de Comunicação e Eventos, a Coordenação de Extensão e o Núcleo de Atendimento ao Público (NAP), a Seção de Museologia decidiu propor a ideia do Festival Museu Nacional Vive. “Mesmo que não estivesse listado como uma atividade da Primavera, achávamos que não poderíamos deixar de marcar nossa presença, mostrando que o Museu continuava trabalhando. O momento do incêndio foi muito devastador mas também muito mobilizador. Havia uma vontade imensa de ação, de trabalhar para continuar o contato com o público do Museu e conversar com a sociedade sobre o que tinha acontecido”, relembra Mayumi, ressaltando o entendimento que a Primavera dos Museus era uma oportunidade muito simbólica de reforçar a recém-criada mensagem: Museu Nacional Vive.
A ideia surgiu logo após o incêndio, quando algumas museólogas do Museu Nacional participaram de uma reunião com representantes de vários museus do Rio de Janeiro para discutir os impactos que a tragédia poderia trazer para o campo dos museus. “Nessa reunião nos foi perguntado se o Museu Nacional conseguiria fazer alguma atividade na Primavera de Museus. O pequeno grupo ali presente pensou na possibilidade de realizar um evento semelhante aos aniversários do Museu na Quinta da Boa Vista”, lembra Fernanda Pires, do SEMU.
O convite, a adesão e o acolhimento de todos
No início da noite de 14 de setembro de 2018, foi enviado um e-mail convidando todo o corpo social para participar do Festival Museu Nacional Vive nos dias 22 e 23 de setembro, sábado e domingo, como parte da celebração da Primavera dos Museus. Na mesma mensagem, informavam que era para os interessados apresentarem suas propostas em reunião no dia 17 pela manhã no prédio da Biblioteca do Horto para já fechar a programação. A sala ficou lotada com mais de 40 pessoas, entre trabalhadores, estudantes e estagiários para as trocas de ideias e soluções.
Apesar do pouco tempo e da falta de recursos financeiros, o grupo buscou parcerias diversificadas para que conseguissem realizá-lo. “Pra mim isso foi o mais marcante na produção: como conseguimos realizar um evento na Quinta da Boa Vista, contando com a colaboração de tantas pessoas que se dispuseram a colaborar da forma que fosse”, avalia Fernanda Pires.
Corpo social unido na reunião para as propostas para a primeira edição do Festival. Foto: Thaís Mayumi (MN/UFRJ)A maioria dos setores propôs atividades que tinham sido realizadas no evento de 200 anos do Museu, em junho, mas muitos quiseram trazer atividades inéditas. “Em alguns casos, as pessoas tinham perdido parte do material educativo no incêndio e mesmo assim se mobilizaram para participar”, informa Thaís Mayumi.
A Valéria Pereira Silva da Coordenação de Extensão lembra que pensou em acolher a todos do Museu. “Mesmo nos primeiros dias que não tínhamos mais espaço físico de trabalho, a gente ficava nas pessoas. Logo pensei em quem não teria como apresentar suas atividades no Festival, então, eu tive a ideia de criar um varal de fotos chamado ‘Nós somos Museu Nacional’, mostrando que o Museu estava vivo nas pessoas, e recebi mais de 200 e-mails. Até hoje tenho esse material na Coordenação de Extensão”, conta Valéria.
O primeiro Festival: trocas de afeto e conhecimento
O nosso principal objetivo com o Festival Museu Nacional Vive era mostrar à população que o Museu Nacional não havia sido completamente destruído, já que ainda tínhamos acervos, pesquisas em andamento, uma grande quantidade de trabalhadores e muita disponibilidade para dialogar com nossos públicos. “Os dois dias de evento foram lotados e pudemos compartilhar com milhares de pessoas a esperança pela reconstrução do Museu Nacional”, comemora Fernanda. E completa: “Nós, trabalhadores do Museu Nacional, estávamos extremamente fragilizados e impactados com a tragédia que foi o incêndio, mas nos reunimos para realizar esse evento e foi um sucesso. Tanto pra população ver o quanto o Museu Nacional tem uma estrutura forte que vai além do palácio, quanto pra nós mesmos percebermos o quanto o nosso trabalho era importante e permanecia vivo”.
2019: o ano que tivemos algumas edições
Já no final de 2018, foram iniciadas as reuniões para a parceria com o SESC. Isso garantiu que fosse realizada uma grande festa de aniversário do Museu Nacional em junho de 2019, além de três edições do Festival Museu Nacional Vive como possibilidades dentro do projeto de extensão que na época se chamava também Museu Nacional Vive. Um foi realizado no marco de 2 de setembro, data do fatídico incêndio e início da reconstrução, e os outros dois distribuídos ao longo do ano. Com a pandemia de Covid-19, o Festival precisou deixar de ser realizado a partir de 2020.
Em 2023, o Museu Nacional/UFRJ, em parceria com o Projeto Museu Nacional Vive, que é voltado para a nossa reconstrução, reativou a realização do marco de 2 de setembro com o nome Festival Museu Nacional Vive.
Identidade visual do Festival
Assinada pela designer do Museu Nacional/UFRJ, Anna Bayer, a identidade visual do Festival Museu Nacional Vive seguiu a mesma que ela desenvolveu para a campanha Museu Nacional Vive. O nome foi criado pela jornalista do Museu, Fernanda Guedes.
“Era exatamente contrapor o sentimento de luto. A história do Festival se confunde com a história da campanha, pois as duas tinham a mesma motivação: mostrar que, além de um acervo incrível, o que marca o Museu Nacional são as pessoas que nele estão: seus pesquisadores, estudantes, corpo técnico, pessoal da limpeza, segurança. O Museu Nacional é esse corpo vivo. O Museu estava vivo através do trabalho de cada pessoa”, destaca Anna, que tinha chegado ao Museu apenas há um mês antes de 2 de setembro. Ela informa que primeiro surgiu uma marca feita espontaneamente pelo público: “Estamos em luta e não em luto”, mas precisávamos de algo que de fato demonstrasse essa vida do Museu.
Ela explica que a hashtag Museu Nacional Vive é uma adaptação em cima do selo de 200 anos, que foi desenvolvido por uma estudante da Escola de Belas Artes da UFRJ (EBA) e que foi a identidade do Museu no aniversário de 200 anos , que tinha acabado de acontecer em junho de 2018. “Criar peças gráficas para o Museu tem o gostinho de contribuir pra algo maior: pra difusão científica e de alguma forma impactar na vida de variados públicos, famílias que visitam a Quinta da Boa Vista. É tornar de fato o Museu, num museu do povo! E o Festival é aquele momento em que víamos o Museu vivo, mesmo com o palácio em ruínas, mesmo com exemplares perdidos, ali víamos a esperança no olhar de cada pessoa. E isso é único.”, explica Anna Bayer.
“Acredito que o Festival foi parte da semente do nosso ânimo, que só cresceu ao longo dos últimos 5 anos. Mesmo passando por momentos muito difíceis e desanimadores, seguimos em frente com vistas ao futuro que esperamos colher em breve, com a plena reconstrução do nosso Museu Nacional”, conclui Thaís Mayumi.
Este conteúdo foi feito a partir de entrevistas com: Fernanda Pires e Thais Mayumi da Seção de Museologia (SEMU), Valéria Pereira da Coordenação de Extensão e Anna Bayer do Núcleo de Comunicação e Eventos (NuCE). Outras pessoas também participaram ativamente dessas organizações do Festival.